AZUL DA COR DO MAR
Wednesday, January 16th, 2008É muito interessante essa coisa do sofrimento.
Outro dia vi no Fantástico, no quadro da filósofa Viviane Mosé, uma história, entre tantas outras histórias absurdas que a gente ouve por aí. Um homem honesto, daqueles que vivem para trabalhar na roça e que têm a decência tão fundo que chega nos ossos do corpo, foi acusado e condenado injustamente de ter cometido um crime grave. Na cadeia, apanhou tanto que ficou cego e com uma perna debilitada. Lá passou bons anos da sua vida. Ele e sua família, que dependiam do trabalho dele pra viver, sofreram. Sofreram muito. E, diga-se, não deve haver nada que justifique tamanho sofrimento para pessoas boas como aquelas.
Tem gente que sofre na vida. Gente boa, inteligente, estudiosa, criativa e animada, que não consegue trabalho, ou se consegue, a empresa fecha, tem um chefe invejoso perseguindo, sofre um acidente - e lá vai o emprego embora. Tem gente que jura que conheceu uma boa pessoa pra se casar, mas depois que casa, o fulano se mostra violento, alcoólatra, vagabundo, distante - e lá se vai um sonho de amor destruído, levando junto a dignidade dos envolvidos. Tem gente que finalmente, depois de ralar a vida inteira, ganha na loteria, e quando vai desfrutar da vida mansa, fica doente, ou morre. Gente que é e explorada, maltratada, sujeita a doenças, a maldades de todo o tipo. Gente que não consegue nada fácil. Gente que a vida pisa e judia de muitas formas.
Por outro lado, tem gente que parece guiada por uma estrela diferente todo o tempo. Gente que não merece nada de bom, mas tem tudo - dinheiro fácil, nunca pega nem um resfriado, um amor bacana, beleza, amizades, flores todos os dias, nível zero de preocupação. E estão lá, desfrutando, passando leve pela vida.
O que é que causa esse abismo entre o sofrimento imenso de alguns e a felicidade fácil de outros? Por que às vezes a vida parece tão injusta?
Fiquei pensando nisso. Karma? Não acredito em vidas passadas e reencarnações, portanto, o que tem que ser resolvido e pensado pra mim é aqui e agora. Escolhas? Não dá pra engolir… Será mesmo que tudo, absolutamente tudo está mesmo sob o controle de nossas decisões dessa maneira? Não… Sempre há uma boa parte que não depende de nós. Sorte, azar? E de onde viria essa energia esquisita que se distribui de forma tão desigual? Não… Destino? Coincidências? Provações divinas? Uma eterna propensão natural do ser humano para a dor? Desgraças estatísticas?
As pessoas fazem o jogo do contente, esperando uma redenção que - um dia, elas precisam acreditar - virá. Dizem que é bom se conformar, que a vida é assim mesmo, que nunca a tempestade é maior do que podemos suportar, que questionar o destino é errado. E, é claro, tem gente que até vive procurando o sofrimento o tempo todo, punindo a si mesma a aos outros de uma maneira muito cruel. Tem gente que até mesmo se acostuma a sofrer tanto que quando tem um momento feliz não sabe aproveitar, não entende.
Sofredores e não-sofredores… Eu não estou nem em um grupo, nem em outro. A vida foi relativamente boazinha comigo.
Mas eu penso nisso quando vejo essas imagens de gente que perde tudo em uma enchente, que morre em acidente nas estradas por causa de um outro motorista bêbado, que é ludibriado, que pega uma doença rara, que é enganado, que estava no lugar e na hora errada, que nasce e vive sofrendo. E não estou falando só de dinheiro e bens materiais, não. É muito mais que isso.
Às vezes é uma grande pena que esse tipo de questão não tenha resposta… De repente, o lance é mesmo só pra gente perguntar.
Há canções que a gente ouve, canta, reproduz, imita, repete… E um dia, de repente, ela faz tanto sentido que você descobre por que é uma grande canção.
“Ah… Se o mundo inteiro me pudesse ouvir…
Tenho tanto pra contar, dizer que aprendi
Que na vida a gente tem que entender
Que um nasce pra sofrer enquanto o outro ri…
Mas quem sofre sempre tem que procurar
Pelo menos vir achar razão para viver
Ter na vida algum motivo pra sonhar
Ter um sonho todo azul… Azul da cor do mar…”
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